Por Isa Pesce
No dia 15 de outubro de 2019 fui demitida do meu último emprego CLT, como repórter aérea. Em dezembro do mesmo ano gravei minha primeira locução. Foi encomenda de uma amiga íntima de infância, a Julia, pra quem eu contei que estava começando a flertar com a ideia de empreender na comunicação. À época, meu namorido tinha um microfone AT2020 em casa e, claro, tínhamos à disposição um guarda-roupas que virou minha primeira cabine.
Antes dessa história, eu fui estudante, advogada, concurseira, estudante de novo, jornalista, sempre costurando uma formação na outra, desesperada pela descoberta do que realmente fazer na vida. O que eu descobri, entretanto, foi o autoconhecimento e a certeza de que um título jamais me limitaria novamente.
Hoje estou comunicadora bilíngue, com foco em locução e apresentação de Podcasts. Aprendo a cada dia e me conecto com novas possibilidades do mercado. Seguem 8 insights dos dois primeiros anos de transição de carreira para a locução.
- Veja além da crise, mas acolha seu momento de vulnerabilidade: quando fui demitida, senti um luto profundo. Só percebi isso mais tarde, por meio de terapia. Eu não queria viver aquele momento, mas sim substituí-lo com trabalho, e isso me fez muito mal. A energia mudou quando entendi que aquele era um momento de crise pessoal e profissional e que oportunidades também estavam escondidas em meio a dor.
A demissão me deu o tempo necessário para perceber que o modelo tradicional de trabalho não me agradava mais e que eu estava vivendo no piloto automático. A porta da demissão abriu novos caminhos para eu acessar práticas de autoconhecimento. É incrível como passamos a atrair energias diferentes e pessoas alinhadas com nosso novo momento de vida.
- Nutra bons relacionamentos a vida inteira: acreditam que até um paquera do Tinder virou cliente? Nós conversamos pelo app no passado, mas nunca nos encontramos. Anos depois, nos adicionamos no Instagram e lá começamos a falar sobre negócios. Somos parceiros até hoje e a empresa dele é um de meus clientes fixos.
Quando cheguei à etapa de prospecção de clientes, percebi que nenhuma fórmula iria me salvar, mas sim uma força pessoal: a do contato tête-à-tête. Resgatei conversas com ex-colegas da advocacia, professores de Jornalismo, gestores de estágios e de empregos passados. Falava do meu amor pela locução para todo mundo, e é incrível como as pessoas nunca se esquecem de uma profissional apaixonada. Em muitos momentos achei que essas investidas não trariam resultados, mas eles vêm quando menos esperamos.
Além disso, contatos assim tão próximos nos permitem aprender sobre diversas áreas e entrar em contato com oportunidades de trabalhos que passariam despercebidas. Foi assim que, além da locução, passei a produzir roteiros de Podcasts corporativos e, na sequência, apresentar os programas.
A prospecção direcionada também me oportunizou visitar clientes pessoalmente, acompanhar gravações de vídeos dos quais eu faria a locução mais tarde. Enfim, me levou a experiências além-estúdio que hoje somam-se à minha bagagem e repertório pessoal e profissional.
- Foco no cofrinho de segurança: ao longo de toda minha vida minha mãe ensinou a guardar 10% de tudo o que eu ganhasse. Nem sempre o fiz, mas a cultura do cofrinho de segurança esteve sempre comigo. Importante dizer que sou uma mulher branca, extremamente privilegiada. Quando fui demitida, coloquei todo o dinheiro da rescisão em um fundo sem acesso rápido. Só usaria aquela grana para investir em mim mesma, assim que descobrisse o que fazer. Esse dinheiro pagou meu primeiro curso de locução, a evolução de meus equipamentos e também a recente formação em teatro. Acima de tudo, essa reserva me deu segurança para aprender sobre o negócio com calma, sabendo que o investimento na nova profissão, assim como criar uma carteira de clientes, seria de médio a longo prazo.
- Seja e tenha uma rede de apoio: lembra da Julia, a amiga de infância que mencionei no início desse texto? Ela e outras cinco mulheres incríveis são parte da minha rede de apoio. Elas ouviram pela primeira vez minha ideia mirabolante de empreender e trabalhar com a voz. Incentivaram, viraram parceiras e vibraram a cada conquista. Mas sabe aquela história de que a gente se sente melhor ao dar um presente do que receber? É assim que me sinto em relação à rede de apoio. A Julia recentemente mudou-se para o interior para empreender em um negócio familiar. Estive a seu lado nessa transição, bem como no seu casamento, há cerca de duas semanas. Ser rede de apoio àqueles que estão conosco nessa jornada é engrandecedor.
- Filtre as críticas: quando estamos começando, queremos validação de todo mundo, concorda? Por mais que a gente se ouça e acredite ter feito uma boa locução, queremos ouvir um “sim” do pai, da mãe, do amigo, namorado, vizinho, mentor e até dos pets se for possível. Essa foi uma de minhas maiores derrapadas, pois essas pessoas – ainda que muito bem intencionadas – não estavam vivendo o meu processo e também não tinham conhecimento suficiente para efetivamente me orientar em uma locução. Cada opinião era diferente e cada feedback me deixava mais insegura e confusa. Em determinado momento eu parei de perguntar e passei a confiar mais naquilo que eu efetivamente estava ouvindo. Com o tempo, criei uma rede de profissionais da locução com os quais posso contar para feedbacks sinceros e baseados em suas experiências.
- Ouça sua intuição: já tomei calote de cliente, já gastei horas montando orçamentos com designs e detalhamentos incríveis para sequer ter retorno e já trabalhei em projetos que eu preferiria ter evitado. Mas sabe o que é mais incrível? Minha intuição ligou o alerta vermelho em todos esses casos. Por ansiedade e pelo medo de dizer “não”, ignorei. Hoje, antes de aceitar qualquer trabalho, eu respiro, saio do estúdio e depois volto, dou um tempo e ouço meu coração, minha intuição sobre aquele trabalho. Digam o que quiserem os incrédulos. Pra mim, funciona.
- Cuidado com os modismos: se tem uma coisa que as redes sociais trouxeram para nossas vidas pessoais e profissionais foram as tais “trends”, aquilo que a gente tem que seguir e reproduzir para conquistar capital social, para ser notado e também para vender. Mas o gás que você investe nas trends está deixando tempo e energia livres para você investir naquilo que realmente importa para o seu negócio? Vejo muitos locutores reproduzindo trends e produzindo conteúdos pensado para outros locutores, o que certamente traz seus benefícios e aprendizados. Mas será que é realmente isso que precisamos fazer no início de carreira?
- Defina o que é sucesso para você: acho que esse é o ponto mais importante. Tudo o que falei acima serve para mim de acordo com o que eu mesma defini como sucesso pessoal. Ao completar 2 anos como locutora percebi que essa é uma trajetória única e que a tomada de decisão é mais certeira quando definimos quais são nossos valores e objetivos pessoais. Tá tudo certo criar seu próprio modo de fazer dar certo. E é sempre possível recalcular a rota e ajustar as velas.
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